Adalice Araújo

Cassiana Lacerda

Fernando Bini

Fernando Velloso

José Carlos Cifuentes

Maria José Justino

Nilza Procopiak

Sérgio Kirdziej

A pintura como exercício de liberdade

A obra de Guilmar Silva – enquanto pintura – segue uma linha de ascensão bastante coerente, que vai da apreensão da realidade à dialética da forma que, apesar de figurativa, gradativamente se depura, até a descoberta da poética de pintar, como exercício de liberdade.

Sem abandonar seu processo de criação, profundamente inserido na música – em vez de construir uma rigorosa arquitetura sonora, como na fase anterior –, agora ela deixa fluir o gesto/cor, cabendo-nos distinguir, em suas obras mais recentes, um nítido parentesco com o expressionismo abstrato.

Em uma primeira etapa do seu processo de criação, sua pintura identifica-se totalmente com a abstração pura. Na medida em que – lançando mão de elementos gráficos – retrabalha as composições, é possível reconhecer visões urbanas muito livres, que por sua intensa vibração nos remetem ao raionismo russo. Todavia, seguindo a Einfühlung, em vez de traduzir as linhas-forças mediante raios paralelos e contrários, ela redimensiona o paisagismo urbano, decompondo-o – via inconsciente – em energia pura. Noções de tempo e espaço são superadas para prevalecerem sonoridades pintadas, cujo clima oscila de lírico a dramático; daí detectarmos desde um “Scherzo” até um “Allegro con Fuoco” ou ”Smanioso”.
Por vezes, tons surdos – terras, sépias, negros, neutros – harmonizam-se dentro de uma cromia refinada que, porém, não impede de vir à tona uma sensibilidade dinâmica.

Outras vezes, a intensidade das cores complementares eletriza as composições. Alimentadas da vibração dos amarelos, vermelhos, negros e azuis profundos rompem a barreira das formas para ficarem na essência.

Longe de ser linear, seguindo o caminho de Klee e Baumeister, é ainda possível detectar na obra de Guilmar Silva marinhas imaginárias e toda uma cosmogonia gestada no inconsciente coletivo. Isso não impede que ela revele a fúria sagrada de uma artista indignada tanto diante dos grandes conflitos sociais do país como das grandes catástrofes internacionais, neste confuso limiar de século.

O surpreendente é que, dando as costas à teoria, Guilmar Silva confessa o seu prazer lúdico de pintar; tão puro e espontâneo como o canto dos pássaros.

Adalice Araújo
Fevereiro de 1992.


3ª Coletiva Guaíra 85/ MAC-PR

É impossível desassociar a obra de Guilmar Silva da sua personalidade. Em maio de 83 ela fez sua primeira exposição individual de pintura na galeria CCBEU, com telas impregnadas de um paisagismo urbano em que unia lirismo e valores plásticos depurados. A consagração, os prêmios em salões, aconteceriam logo depois, com as litografias da fase nacionalista dos bambuzais, nas quais dava, ainda, um lírico testemunho da rica vegetação brasileira.
           
Guilmar poderia ter-se contentado com aquela fase, que tanta empatia causava no público. Porém, para ela, aquela presença doce não era suficiente para esconder o seu tumulto interno, a aguda consciência existencial e social que freqüentemente leva os verdadeiros artistas – mesmo aqueles que são extremamente organizados no seu método de trabalho como Guilmar – a romper com as amarras.
           
Guilmar uma das mais marcantes personalidades do cenário artístico paranaense assume o difícil processo de ruptura com o consagrado. Mesmo ferindo o “bom gosto oficial” deixa fluir-se sobre a pedra – o espontâneo, a inquietação, o inconsciente. Insinuam-se janelas de casebres e edifícios: o espaço dinamiza-se revelando o tormento do homem de hoje, ameaçado, que procura nos casulos, seus esconderijos/moradas. No espaço, que rompe o visual bem comportado, surgem: manchas, texturas, o grafismo forte, o gestual, os signos, o interno/externo, os claros/escuros.
           
Em meio a tudo isso, as esferas – copas de árvores – fazem-se presentes, afirmando a necessidade da natureza.
           
Bem, o que sei é que Guilmar Silva é uma grande artista e um ser humano maravilhoso que tem a coragem de assumir posições, sem deixar de estar profundamente comprometida com a verdade. Tenho certeza que a sua obra se imporá como das grandes presenças no cenário nacional.
É só uma questão de tempo.

Adalice Araújo
Agosto de 1985